quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Numa segunda-feira qualquer de quase primavera...

Hoje seria um dia em que gostaria de ter “aquela” boa companhia para jantar em casa, ver tv, ficar quieto junto, cada um no seu mundinho particular. Não queria fazer nada demais não. Só queria sentir a presença "daquela" pessoa querida ao lado, em plena segunda-feira cotidiana, em que se chega cansado do trabalho e tudo o que se quer é fazer nada. Desejo simples e complexo esse.

Complexo porque compartilhar uma segunda-feira cotidiana não é para qualquer um e, muito menos, com qualquer um. Verdade seja dita.
Apesar de já fazer uns bons anos que não sei o que é isso, a experiência vivida me deixou um bom legado, acredito sinceramente. Tanto é que consigo reconhecer que a mesma vontade que me motivou a escrever esse post, um dia foi a grande vilã de uma estória que tinha tudo para dar certo, em teoria. Quem já viveu uma vida a dois sabe como o cotidiano pode ser cruel.

E o pior é que, ao que me parece, o mais provável é que a rotina a dois, em qualquer relação, naturalmente tende a se tornar monótona, mesmo com muito amor. Quiçá com pouco! Mas e aí? Faz como?

Na verdade fazia tempo que não me lembrava dessa sensação com tanta clareza. E está sendo bom. Bom porque me fez reconhecer que por detrás da minha declarada vontade de vivenciar novamente uma relação de maior proximidade, que possibilitaria (também em teoria) realizar o meu desejo do dia, há uma gama de “coadjuvantes” que na hora de sonhar passam desapercebidos. Mas na vida real eles não se deixam passar desapercebidos. Pelo contrário. Têm grande destaque.
Até então, na minha mente sonhadora, todo dia deveria ser dia do mocinho beijar a mocinha, de dar-lhe flores, contagiá-la com mil e um papos interessantíssimos, recebê-la com o sorriso mais aberto e o melhor dos humores, etc, etc, etc. Mas é óbvio que o cotidiano mostra tudo o que de mais verdadeiro o outro pode oferecer: carinho, atenção, respeito, companheirismo, até ser mal-humorado, soltar pum, ser egoísta, não estar a fim de fazer a mesma coisa, não ter tempo livre, querer sair com os amigos, etc, etc, etc. É, vida a dois, definitivamente, não é fácil não.

E depois de ler muita Martha Medeiros, Arthur da Távola, Arnaldo Jabor e literaturas afins, ao longo dos meus exatos 15 anos de sonhos super ultra mega encantados, não tenho mais dúvida que as relações que dão certo são baseadas numa espécie de compartilhamento de concessões. Um concede aqui, outro ali, e aos poucos os dois vão encontrando uma forma de equilibrar vontades e expectativas. Putz, mas haja disposição, ainda mais em tempos de tanto imediatismo e conseqüente ansiedade!

Na verdade, acho que os avanços tecnológicos somados ao aumento do consumo, de uma forma geral, trouxeram sérias e irreversíveis mudanças na forma de se relacionar no mundo contemporâneo. Hoje o que se considera é se o outro atende de imediato às nossas vontades e expectativas. Se não atender, a gente tende a imediatamente virar a página e fazer a fila andar num curtíssimo espaço de tempo. E essa prática tem tornado as relações cada vez mais frágeis e voláteis, como bem insiste em dizer o meu já considerado amigo Zigmund Balman, tão mencionado por mim aqui em outros tempos. Prova disso é a quantidade avassaladora de casamentos que não chegam a completar nem um ano, o que não pode causar espanto diante desta nova realidade em que ninguém está disposto a aprender a conviver, a dividir rotina e regar a relação diariamente, com um agradinho aqui, outro ali, para fazer com que o amor floresça de verdade, em meio às chatices inevitáveis do cotidiano.

A verdade é que todos nós queremos ter o mesmo amor extraordinário que vemos na novela das oito, ao chegar em casa cansado numa segunda-feira cotidiana. E assim, mata-se qualquer chance de amor verdadeiro num curto espaço de tempo; enquanto isso, multiplicam-se solteiros sonhando com romances impossíveis.

O que se escuta dizer muito comumente por aí é que o primeiro ano é crucial. Ou vai ou racha. Ao se deparar com a primeira segunda-feira monótona, o que se faz é achar logo uma válvula de escape para se evitar situações cotidianas. Mas como fugir do cotidiano se uma hora ou outra ele irá aparecer trazendo consigo a tão temida monotonia, a mesmice, a falta de assunto, etc, etc, etc. E aí? O amor acaba? Todos os planos juntos vão por água abaixo? Será que existe uma fórmula para evitar que a monotonia se instaure na relação e extermine qualquer possibilidade de se enxergar um brilho nos olhos do outro em plena segunda-feira cotidiana?

Não acho que seja fácil construir uma relação duradoura, onde prevaleça ao menos a metade de tudo aquilo que a gente sonha, mas sou crédula quanto a tornar esse paraíso possível se os dois estiverem dispostos a rever conceitos, reiventar regras e caminhas de mãos dadas, munidos de uma única certeza: que um faz bem ao outro.

Bom, não sei se um dia irei me casar de novo (I hope so!) e construir a família que sonho desde pequenininha, mas hoje consigo enxergar a realidade de forma muito clara, apesar de volta e meia insistir em sonhar acordada com um romance impossível. Vida a dois não é mole não!

Mas a verdade é que sigo em busca de uma companhia especial que se identifique com o que estou dizendo e tenha energia disponível para compartilhar da disposição de dividir o silêncio de uma madrugada ou mesmo um agito de sábado à noite; que saiba expor sentimentos; ouvir e calar quando necessário; que esteja disposto a doar-se e a receber; que queira aprender a conviver, dia a dia, motivado pela vontade de aprender a compartilhar momentinhos cotidianos, mesmo que eles já estejam carimbados com a monotonia nossa de cada dia.

E mesmo os aventureiros dispostos a tentar ir adiante e enfrentar todos os desafios de uma vida a dois, ainda poderão se deparar frente a frente com a pior das solidões: a solidão a dois. E por já tê-la visto de perto, reconheço sua frieza, com todas as suas nuances, e, consequentemente, não duvido de sua temeridade.

E é por isso que, enquanto isso, na sala de justiça, em meio a tantas reflexões em meio a uma segunda-feira qualquer de quase primavera, vou vivendo mais esta noite solitária em muito boa companhia: a minha.

“ Que minha solidão me sirva de companhia;
Que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Que eu saiba ficar com o nada
E mesmo assim me sentir
Como se estivesse plena de tudo”

Clarice Lispector

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